A MINHA HOLLYWOOD E A MINHA LOS ANGELES
O SEU CINEMA E O SEU FASCÍNIO
O ano de 2003 há-de ficar para sempre na minha memória como o ano em que pela primeira vez fiz a peregrinação à Meca do cinema, à mítica Hollywood. E digo que fiz essa peregrinação pela primeira vez a Hollywood, porque conto viajar pela América mais vezes, agora que já conheço minimamente o acolhedor povo americano, que me tratou sempre com muito respeito e com muita amizade.
E muito embora tivesse visitado muitas cidades nas minhas deambulações por uma grande parte da nação americana, a verdade é que Hollywood foi a cidade que indiscutivelmente mais me encantou. E o que digo de Hollywood pode alargar-se a todo o conjunto de quarenta cidades que constituem a grande metrópole de Los Angeles. É que o cinema que eu amo e que julgava pertencer só à cidade de Hollywood é afinal um produto de toda a área metropolitana de Los Angeles.
Sim, porque toda a cidade de Los Angeles respira cinema por todos os poros. Fiquei hospedado num hotel de luxo, o Marriott, e a minha suite situava-se na parte da frente do hotel, com vistas para a Figueroa Street, que é uma avenida enorme, uma autêntica auto-estrada. Ora, precisamente numa das transversais da Figueroa Street, a cerca de um quilómetro do Hotel Marriott e muito perto do restaurante onde comi a maior parte das minhas refeições em Los Angeles, estavam a decorrer as filmagens do Homem-Aranha 2 e eu obviamente assisti a elas.
Foram três noites consecutivas em que, depois de jantar na elegante esplanada do restaurante, mes deslocava apenas uns cem metros, para assistir às filmagens.E logo notei que a cidade de Los Angeles sacrifica tudo em prol do cinema. O trânsito que é imenso nessa e noutras avenidas da downtown foi totalmente suspenso nas imediações do local das filmagens e os muitos espectadores que conjuntamente comigo a elas assistiram foram mantidos à distância por simpáticos e correctos polícias americanos.
É que o cinema em Los Angeles está em primeiro lugar. Por isso se pode dizer que é toda a Los Angeles e não só Hollywood que é a cidade do cinema. É certo que na cidade de Hollywood propriamente dita e especialmente no Hollywood Walk of Fame (Hollywood Boulevard), com os nomes das principais estrelas gravados no passeio, o sabor e o cheiro do cinema é muito mais intenso e o meu gozo cinéfilo nessa nave central da sétima arte foi portanto muito maior.
E então quando visitei o Teatro Kodak, onde tem lugar anualmente a cerimónia da distribuição dos óscares, eu senti uma emoção igual àquela que experimento
quando entro nas mais belas catedrais. É que, à semelhança de certos templos, o Teatro Kodak até tem uma monumental cúpula. E eu subi pela imponente escadaria que dá acesso aos andares superiores, tendo-me até deitado no chamado divã do realizador, que se destina à última fase do teste de uma pretendente a actriz.
Supondo que eu era o realizador de um determinado filme e que estava fazer o teste a uma linda e jovem candidata a entrar nesse filme, primeiramente essa candidata teria que fazer provas de dicção, de movimento diante das câmaras, etc., etc. E no fim, como última prova do teste, teria que dormir comigo. Esse é precisamente o sentido irónico do divã onde eu estive deitado, à espera da candidata a actriz, para fazer comigo a última prova, dormir com o realizador, como se pode ver numa das fotografias.
Mas Hollywood não se reduz ao Hollywood Walk of Fame, ao Teatro Kodak ou ao Teatro Chinês, aliás há várias Hollywoods, Hollywood Highland, Hollywood Western, Hollywood Vine, North Hollywood, etc. e vários locais importantes em Hollywood, tais como Beverly Hills, Sunset Boulevard, Universal Studios, etc., etc. Dentre esses locais importantes, cumpre destacar os estúdios da Universal, que são os maiores e que são aliás os únicos que estão aproveitados turisticamente.
Passei lá um dia inteiro, desde as nove da manhã até às nove da noite, visitando tudo o que havia para visitar, desde as cidades dos westerns e dos filmes históricos até ao motel e à casa do filme Psico, de Hitchcock. E também me diverti imenso no Parque Jurássico, onde vi muitos dinossauros ferozes e ameaçadores. E fiz uma viagem alucinante na máquina do tempo, no pavilhão do filme Regresso ao Futuro.
E ainda apanhei uns enormes sustos no pavilhão de A Múmia, sustos que foram compensados com a visita que também fiz ao engraçado pavilhão do meu migo Shrek. Para conseguir ir a todos esses sítios, andei umas vezes num autocarro aberto apropriado e outras vezes utilizei as maiores escadas rolantes do mundo. Enfim tive um grande prazer em visitar os estúdios em que trabalha Steven Spielberg, o maior génio do cinema actual.
Quando o avião levantou voo rumo a Nova Iorque, foi com imensa tristeza que deixei a maravilhosa cidade de Los Angeles. É que esta cidade, que é ao mesmo tempo a cidade do cinema, a cidade das estrelas e a cidade dos anjos, é para mim, que sou cinéfilos e que gosto de estrelas e de anjos, uma das cidades mais belas do mundo e o sítio do planeta onde em toda a minha vida me senti mais feliz.
POST SCCRIPTUM: O
cinema esteve sempre presente nesta minha visita à Califórnia. Já em
S. Francisco me lembrei de um filme de Hitchcock, Os Pássaros, e por
isso fui imaginariamente atacado por um bando de agressivas e perigosas
aves, enquanto passeava pelas ruas da cidade. E nas minhas viagens de
avião de costa a costa, recordava-me dos filmes on the road e tive pena
de não ter feito essas viagens à flor do solo.
E em Holywood vivi o
cinema intensamente, com a fúria apaixonada de um impetuoso namorado da
sétima arte, como se a minha alma fosse feita apenas de cinema. E ainda
me lembrei do filme Psico, também de Hitchcock, pois na minha
inolvidável visita aos estúdios da Universal passei junto da casa e do
motel de Anthony Perkins, mas como gosto muito de miúdas bonitas
despidas a tomar banho resolvi não matar nenhuma garota no chuveiro.
WASHINGTON
WASHINGTONWASHINGTON
No Cemitério Nacional de Airlington
In the Airlington National Cemetery
No monumento de Washington
In the Washington monument
No Lincoln Memorial
In the Lincoln Memorial
No cemitério da guerra da Coreia
In the Korean war cemetary
Na casa Branca - In the White House
Na Casa Branca - In the White House
UMA ESTADIA DE SONHO EM NOVA IORQUE E EM WASHINGTON
Hoje vou falar-vos dos quatro dias, passados em Nova Iorque, que é para mim uma das cidades mais belas do mundo, além de ser a capital mundial da arte e da cultura. E assim, logo no transfer entre o aeroporto em New Jersey e o hotel me apercebi, depois de atravessar um túnel sob o Rio Hudson, da avassaladora monumentalidade dos seus arranha-céus, tão altos que só com dores permanentes nas vértebras cervicais é possível contemplar a sua arquitectura em toda a sua plenitude.
E nem de propósito, muito perto do meu hotel ficava o Empire State Building, um dos edifícios mais altos do mundo, no cimo do qual se desfruta um soberbo panorama sobre a cidade. Com efeito, o hotel em que fiquei, o Hotel Wolcott, está mesmo no centro de Nova Iorque, perto da Broadway e junto à Quinta Avenida, que percorri inúmeras vezes, pois os principais museus, o Metropolitan Museum of Art, um dos melhores museus do mundo, e o Salomon Guggenheim Museum, um óptimo museu de arte moderna e um edifício encantador, situam-se todos nas imediações da Fifth Avenue.
E eu aliás andei a pé sempre que possível para melhor sentir o peso de toda a imensa multidão de Nova-Iorque. E também andei em toda a Manhattan e também em Brooklin nos autocarros abertos da Gray Line. E ainda tive tempo de me lembrar do meu tão querido poeta Garcia Lorca e da sua inspirada descrição poética da cidade de Nova Iorque na Ode a Walt Whitman, enquanto percorria os mesmos sítios cantados em verso pelo genial escritor espanhol.
Andei muito, principalmente em Manhattan, que foi a sede da minha estadia, e fui todas as noites à célebre Time Square e à Broadway, que são um autêntico deslumbramento. Eu pelo menos nunca tinha visto uns lugares tão cheios de luz e tão feéricos, tão cheios de cinemas e de teatros e com tanta gente a passear na rua pela noite adentro.
Também fui num selecto cruzeiro nocturno, com gente muito rica, em iate de luxo, até à Estátua da Liberdade, que como se sabe fica em pleno mar no sul de Manhattan, e enquanto ia dando umas espreitadelas para a cidade de Nova Iorque toda iluminada ao longe, diverti me-me imenso no baile que se seguiu ao jantar a bordo.
Também aproveitei o facto de estar relativamente perto de Washington (350 quilómetros) para passar um dia na capital dos Estados Unidos e visitar os seus principais monumentos, incluindo a Casa Branca, o Capitólio, o Supremo Tribunal, a National Gallery, o Lincoln Memorial e o cemitério de Arlington. Foi uma inesquecível viagem à cidade dos pais da nação americana que com os seus ideais de vida, de liberdade e de busca da felicidade são também os pais da democracia moderna em todo o mundo.
NEW YORK
NEW YORK
NEW YORK
Nas Nações Unidas - In the United Nations
Em Nova Iorque - In New York
Na Broadway - In the Broadway
Em Time Square - In Time Square
Em Time Square - In Time Square
No bus turístico, em Time Square
In the turistic bus, in Time Square
No bus turístico, na 5ª avenida
In the turistic bus, in the 5th avenue
No bus turístico - In the turistic bus
No Battery parc - In the Battery parc
No poro de Nova Iorque
In the New York port
Num cruzeiro para a Liberty e a Ellis island
In a cruise to liberty and Ellis island
Num cruzeiro - In a cruise
Com a estátua da Liberdade
With the statue of the Liberty
Com a estátua da Liberdade
With the statue of the Liberty
Num cruzeiro para Ellis island
Ilha da imigração
In a cruise to Ellis island
Immigration Island
Num cruzeiro, em Ellis island
In a cruise, in Ellis island
No Harlem, na Rua 125ª
In Harlem, in the 125th Steet
Na Rua 125ª - In the 125th Street
Na Rua 125ª - In the 125th Street
No Museu de Arte Moderna
In the Museum of Modern Art
No Museu de Arte Moderna
In the Museum of Modern Art
UM MEMORÁVEL MUSICAL NA BROADWAY
NUMA MÁGICA VISITA A NOVA IORQUEAproveitei o feriado religioso do dia 26 de Maio para fazermos um fim-de-semana alargado e assim passei cinco dias em Nova Iorque. Já tinha estado em Nova Iorque numa outra visita que fiz aos Estados Unidos da América, que incluiu também as cidades californianas de São Francisco , Monterey, Carmel, Santa Bárbara e Los Angeles.
Nesta viagem, porém, o meu propósito era assistir a um espectáculo num dos teatros da Broadway e também visitar o Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, o celebérrimo MoMA, pois na minha visita anterior aos Estados Unidos o Museu de Arte Moderna tinha mudado para Queens, onde funcionou durante bastante tempo numa garagem, em instalações provisórias, enquanto duraram as obras no seu edifício original, situado na 53th Street, perto da Quinta Avenida.
Também aproveitei ara conhecer melhor a cidade de Nova Iorque, percorrendo toda a sua área metropolitana nos excelentes autocarros de dois andares, abertos no andar de cima, da Gray Line Sightseeing Tours. E foi assim que desta vez não me limitei à área central de Nova Iorque, entre a zona do Empire State Building e a zona do Central Park, onde se situam o Metropolitan Museum of Art e o Solomon Guggenheim Museum.
Desta vez, com efeito, percorri a ilha de Manhattan no sentido norte-sul, rumo à downtown, e nesta conformidade fui até ao extremo sul da ilha, em Buttery Park, passando por Greenwich Village, pelo SoHo, por Little Italy, por Chinatown e pelo World Trade Center, onde me associei à sentida homenagem que o guia fez às vítimas do ataque terrorista de 11 de Setembro.
Nesta incursão pela downtown, também fui a Brooklyn e também fiz um cruzeiro, a partir do Battery Park, para a ilha onde se situa a Estátua da Liberdade, a Liberty island, e também para outra ilha, a Ellis Island, onde antigamente os emigrantes tinham que regularizar a sua situação, antes entrarem no porto de Nova Iorque.
Também fiz no dia seguinte um tour em sentido contrário, pela uptown Manhattan, atravessando de autocarro todo o Central Park até ao mítico bairro negro do Harlem, onde parei para almoçar e onde percorri a pé, durante duas horas, os seus sítios mais característicos. Tive alguns problemas, pois os negros que estavam nos passeios da movimentada 125th Street, onde se situa o emblemático Teatro Apollo, não queriam que tirasse fotografias, tendo mesmo uns vendedores ambulantes negros o descaramento de nos dizer: «no pictures here».
O ambiente que encontrei no Harlem é muito semelhante ao dos filmes de Spike Lee, mas eu consegui desarmar os pretos mais arrogantes com a minha boa educação e com o meu civismo e acabei por tirar as fotografias que pretendia.
Aproveitei o facto de o autocarro que me trouxe de volta do Harlem para a midtown passar muito perto do Museu de Arte Moderna para descer na paragem mais próxima. O museu tem excelentes colecções de arte moderna e contemporânea, que vão desde os pintores impressionistas até aos artistas pop americanos da segunde metade do século XX. O remodelado edifício em que funciona agora o museu, inaugurado em 8 de Novembro de 2004, é um belo e moderno espaço, desenhado pelo arquitecto Yoshio Taniguchi.
Quanto ao espectáculo a que assisti, o musical Chicago, é um musical com a assinatura do genial coreógrafo Bob Fosse. O excelente filme, vencedor de muitos óscares, que foi extraído da peça da Broadway, despertou-nos o interesse para ver o espectáculo teatral.
O teatro onde a peça é representada, o Ambassador Theatre, fica na 49th Street, muito perto de Time Square. É um velho e venerável teatro, com enormes dimensões e com vários mezaninos e com uma inclinação tão acentuada que as cabeças dos espectadores da última fila quase tocam no tecto.
Mas o teatro não só é descomunal na sua enorme plateia como tem igualmente um palco enorme. O que é curioso é que a orquestra não actua num fosso, em frente do palco, como é normal nos antigos teatros. Os músicos da orquestra actuam em pleno palco, onde também representam os actores. Curioso foi também constatar que muitas senhoras vão ao teatro com vestidos de noite,apropriados, como era usual no início do século passado.
Quanto ao musical propriamente dito, resta-nos acrescentar que é um espectáculo memorável, tanto do ponto de vista musical propriamente dito como do ponto de vista das partes faladas, notando-se inclusivamente na peça da Broadway uma harmonia mais conseguida do que no filme entre o enredo propriamente dito e os números musicais. Vencedor de seis Tony Awards, incluindo o de best musical revival, Chicago foi incontestavelmente o mais mágico de todos os momentos mágicos desta nossa mágica visita a Nova Iorque.
O GRANDE POEMA A NOVA IORQUE
E AOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA
ODE A WALT WHITMAN
(AUTOR: GARCIA LORCA)
Pelo East River e pelo Bronx
os rapazes cantavam mostrando as cinturas.
Com a roda, o óleo, o coiro e o martelo
noventa mil mineiros arrancavam a prata das rochas
e os garotos desenhavam escadas e perspectivas.
II
Porém nenhum adormecia,
nenhum queria ser rio,
nenhum amava as grandes folhas,
nenhum, a língua azul da praia.
III
Pelo East River e pelo Queensborough
os rapazes lutavam com a indústria,
os judeus vendiam ao fauno do rio
a rosa da circuncisão
e o céu desembocava por pontes e telhados
manadas de bisontes empurradas pelo vento.
IV
Porém nenhum se detinha,
nenhum queria ser nuvem,
nenhum procurava os fetos
nem a roda do tamboril.
V
Quando a lua nascer,
as polés rodarão para turvar o céu;
Um limite de agulhas cercará a memória
e ataúdes serão levados aos que não trabalham.
VI
Nova Iorque de lama,
Nova Iorque de arame e de morte:
Que anjo levas oculto na tua face?
Que voz perfeita dirá as verdades do trigo,
o sonho terrível das tuas anémonas manchadas?
VII
Nem um só momento, velho e formoso Walt Whitman,
deixei de olhar a tua barba cheia de borboletas,
os teus ombros de bombazina gastos pela lua,
as tuas coxas de Apolo virginal,
a tua voz como coluna de cinza;
ancião formoso como a bruma,
que gemias como um pássaro
com o sexo atravessado por uma agulha.
Inimigo do sátiro.
Inimigo da vide
e amante dos corpos ocultos por tecidos grosseiros.
VIII
Nem um só momento, formosura viril,
que em montes de carvão, vias-férreas e anúncios,
sonhavas ser um rio e dormir como um rio
com aquele camarada que poria no teu peito
uma pequena dor de ignorante leopardo.
IX
Nem um só momento, Adão de sangue, Macho,
homem sozinho no mar, velho e formoso Walt Whitma,
porque nas esplanadas,
agrupados nos bares,
saindo em cachos das sargetas,
tremendo entre as pernas dos chauffeursou
girando nas plataformas do absinto,
os maricas, Walt Whitman, apontam-te.
X
Também esse! Também! E despenham-se
na tua barba luminosa e casta,
loiros do Norte, negros das areias,
multidões de gritos e ademanes,
como os gatos e as serpentes,
os maricas, Walt Whitman, os maricas
turvos de lágrimas, carne para chicote,
bota ou mordedura de domadores.
XI
Também esse! Também! Dedos pintados
apontam a margem do teu sonho,
quando o amigo come a tua maçã
com um leve sabor a gasolina,
e o sol canta nos umbigos
dos rapazes que brincam sob as pontes.
XII
Mas tu não procuravas olhos arranhados
nem o pântano sombrio onde afogam os garotos,
nem a saliva gelada,
nem as curvas feridas como panças de sapos
que levam os maricas em carros às esplanadas
enquanto os fustiga a lua pelas esquinas do terror.
XIII
Tu procuravas um nu que fosse como um rio.
Toiro e sonho que junte a roda à alga,
pai de tua agonia, camélia da rua morte
e gemesse nas chamas do teu Equador oculto.
XIV
Porque é justo que o homem não procure o prazer
na selva de sangue da manhã mais próxima.
O céu tem praias onde evitar a vida
e há corpos que não devem repetir-se na Aurora.
XV
Agonia, agonia, sonho, fermento e sonho.
Assim é o mundo, amigo, agonia, agonia.
Apodrecem os mortos sob o relógio das cidades,
passa a guerra chorando com um milhão de ratas cinzentas,
os ricos dão às suas amantes
pequenos moribundos iluminados,
e a Vida não é nobre, nem boa, nem sagrada.
XVI
Pode o homem, se quiser, conduzir o desejo
por veia de coral ou nu celeste;
amanhã todo o amor será rocha, e o Tempo
a brisa que chega adormecida pelos ramos.
XVII
Por isso não ergo a minha voz, velho Walt Whitman,
contra o garoto que escreve
um nome de menina na sua almofada,
nem contra o jovem que se veste de noiva
na penumbra da sua alcova,
nem contra os solitários dos casinos
que bebem com nojo a água da prostituição,
nem contra os homens de olhar verde
que amam outro homem queimando os lábios em silêncio.
Mas sim contra vós, maricas das cidades,
de carne apodrecida e pensamento imundo.
Mães de lodo. Harpias. Inimigos sem o sonho
do Amor que reparte grinaldas de alegria.
XVIII
Contra vós sempre, que aos rapazes dais
gotas de suja morte com veneno amargo.
XIX
Sempre contra vós,
Faeries da América,
Pájaros de Havana,
Jotos do México,
Sarasas de Cádis,
Apios de Sevilha,
Cancos de Madrid,
Floras de Alicante,
Adelaides de Portugal.
XX
Maricas de todo o mundo, assassinos de pombas!
Escravos da mulher, cadelas de seus toucadores,
abertos nas praças com febre de leque
ou emboscados em hirtas paisagens de cicuta.
XXI
Não haja trégua! A morte
irrompe dos vossos olhos
e junta flores de cinza na margem do lodo.
Não haja tréguas! Alerta!
Que os confundidos, os puros,
os clássicos, os predestinados, os suplicantes
vos fechem as portas da bacanal.
XXII
E tu, belo Walt Whitman, dorme nas margens do Hudson
com a barba virada ao pólo e as mãos abertas.
Argila branca ou neve, a tua língua chama
Camaradas que velem tua gazela sem corpo.
XIII
Dorme, não fica nada.
Uma dança de muros agita as pradarias
e a América afoga-se em máquinas e pranto.
Quero que o ar forte da noite mais profunda
tire flores e letras do arco onde dormes
e um garoto negro anuncie aos brancos do oiro
a chegada do reino das espigas.
Tradução de Eugénio de Andrade
HOTÉIS
S: FRANCISCO - HILTON HOTEL
SANTA MARIA - SANTA MARIA INN
LOS ANGELES - MARRIOTT HOTEL
NOVA IORQUE - WALCOTT HOTEL
Primeira viagem (Califórnia) - Julho de 2003
Segunda viagem (Nova Iorque e Washington) - Maio de 2005
GUIAS
MÁRIO - S. FRANCISCO
FERNANDO - LOS ANGELES
RUBEN - WASHINGTON
DISTÂNCIA LISBOA - NOVA IORQUE - 5450 KMS.